sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010
quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010
10/02/2010 - Prof Bedone
FADI - SOROCABA
DIREITO CIVIL I
PARTE GERAL
PRIMEIRO SEMESTRE
23/02 e 24/02/10
A-) CONCEITO DE DIREITO:
- Tema que impossibilita fechar-se questão a respeito
em outras palavras, jamais será unívoco
método: apresentar três perspectivas diferentes, que se complementam
portanto, todas estão corretas, só que cada uma a seu modo
- “É o princípio de adequação do homem à vida social” (Caio Mário da
Silva Pereira)
elementos: princípio, adequação e homem/vida social
princípio: pilar de sustentação de alguma coisa
adequação: pertinência entre dois objetos (homem e sociedade)
homem/vida social: razão da existência do Direito = vida em sociedade,
daí se dizer que ubi societas, ibi ius foco desse conceito: a sociedade dá ensejo ao Direito
- “É a norma das ações humanas na vida social, estabelecida por uma
organização soberana e imposta coativamente à observância de todos”
(Ruggiero e Maroi, apud Sílvio Rodrigues)
elementos: norma das ações humanas na vida social, organização
soberana, imposta coativamente a todos
norma das ações humanas na vida social: regra de conduta para o
homem, ou abordagem e regulação de comportamentos humanos
organização soberana: estabelecida pelo Estado, o qual é dotado de
soberania (uma ordem não sujeita a qualquer outra); elementos do
Estado: povo, território e soberania
imposta coativamente a todos: a norma jurídica é dotada de duas
características básicas, quais sejam, universalidade e coercitividade
foco desse conceito: Direito emana do Estado e é coercitivo
- “Um ordenamento de normas que regulam relações intersubjetivas –
normas cuja violação provoca uma reação institucionalizada” (Orlando
Gomes, apud Lumia)
elementos: relações intersubjetivas e reação institucionalizada
relações intersubjetivas: o Direito regula relações de uma pessoa para
com outra; é a disciplina da convivência, no dizer de Goffredo Telles Jr.
reação institucionalizada: como a norma jurídica é coercitiva, segue-se
que sua observância é obrigatória; caso contrário, haverá a sanção ao
seu descumprimento, pois se trata de comando, não de recomendação
e é institucionalizada porque patrocinada pelo Estado
foco desse conceito: sanção
- Integração dos três conceitos
a sociedade enseja o Direito
o Direito cria normas universais e coercitivas
se descumpridas, geram uma sanção institucionalizada
- Minha contribuição
Direito é forma e função
forma porque contenta-se com o comando e sua interpretação
função porque visa à resolução de problemas
modo de se concretizar forma e função: linguagem
- Paralelo entre Direito e Moral
a velha imagem dos círculos concêntricos ainda é válida, daí se poder
dizer que tudo que é do Direito pertence à Moral, mas a recíproca não
é verdadeira
semelhança: ambos regulam comportamentos humanos
diferença específica: as normas morais não são coercitivas
logo, são destituídas de sanção institucionalizada; a condenação
é meramente social ou imposta pelo tribunal da consciência
ex.: estado de necessidade
B-) OUTROS CONCEITOS BÁSICOS:
- Direito positivo
de positum (posto) = direito em vigor
- Direito objetivo
é a norma jurídica que regula um comportamento humano
outra denominação: norma agendi
- Direito subjetivo
prerrogativa de se invocar a aplicação do direito objetivo a seu favor
outra denominação: facultas agendi
- Direito Público e Privado
categorização de pouca utilidade prática; serve apenas para o aluno
saber em que terreno está pisando
público: diz respeito diretamente ao Estado e indiretamente às pessoas
privado: o oposto
exs.: Direito Constitucional e Direito Civil
C-) PANORAMA DO DIREITO CIVIL NO CENÁRIO JURÍDICO:
- Histórico
Direito Romano: fruto de longa evolução e condensado no Corpus
Iuris Civilis, de Justiniano, o qual continha cinco livros, quais sejam,
Leis (leis antigas), Novelas (leis novas), Institutas (doutrina), Digesto
(doutrina derivada de julgados) e Pandectas (comentários de glosadores)
Portugal: Ordenações Afonsinas e Manoelinas, calcadas no Direito
Romano; depois, as Ordenações Filipinas, quando o reino português
ficou submetido à coroa espanhola Brasil colônia: vigoraram as Ordenações
Brasil independente: Ordenações Filipinas, de 07/09/1.822 a 31/12/1.916
Código Civil antigo: de 01/01/1.917 até 10/01/2.003
Atual Código Civil: de 11/01/2.003 até os dias de hoje
- Código Civil antigo
bebeu de todas as fontes que o precederam + inspiração nos CC’s
francês e alemão, de 1.804 e 1.896 (Código Napoleônico e BGB)
marcado pelo individualismo e pela preponderância do papel masculino
na sociedade
- Atual Código Civil
idem supra
marcado pela aliança do individualismo à socialidade, pela equivalência
dos papéis masculino e feminino na sociedade, e pela operabilidade
- Caráter nacional
decorrência do disposto no art. 22, I, da Constituição Federal
daí a razão de ser de existir um único Direito Civil para todo o país,
ao contrário, verbi gratia, do que ocorre nos EUA
daí não se poder falar em Direito Civil estadual ou municipal
D-) ESTRUTURAÇÃO DE PRECEPTIVOS LEGAIS:
- Modo pelo qual um texto legal é articulado
OBS: técnica válida também para cláusulas contratuais
- Assuntos tratados pelo texto legal são divididos em itens
tais itens são denominados artigos
abreviação: art. (singular) ou arts. (mais de um artigo)
exs.: art. 25 ou arts. 26 e 27
os nove primeiros artigos são ordenados segundo a forma cardinal
exs.: art. 1º, art. 2º, art. 3º, … art. 9º
daí para a frente são numerados consoante a forma usual
exs.: art. 10, art. 11, art. 12 ... art. 1.912, e assim sucessivamente
- Subdivisão dos artigos
cada artigo pode simples ou complexo
simples: trata do assunto em uma única frase
complexo: trata de um assunto que comporta subdivisões
essas subdivisões se chamam caput, parágrafos, incisos e alíneas
- Caput
corresponde à frase que vem logo a seguir do início do artigo
abreviação: não possui; vem do latim cabeça
ex.: art. 20, caput, do Código Civil
- Parágrafos
detalham ou excepcionam o caput do artigo
abreviação: parágrafo único (para artigos com apenas um parágrafo), ou
§ 1º, § 2º, § 3º, … art. 9º, e daí para a frente são numerados consoante a
forma usual, ou seja, § 10, § 11, § 12 ... e assim sucessivamente (para
artigos com mais de um parágrafo) exs.: art. 20, parágrafo único, ou art. 25, § 2º, do Código Civil
OBS: ao se citar mais de um parágrafo ao mesmo tempo, repetir a
designação; ex.: art. 25, §§ 1º e 2º, do Código Civil
- Incisos
enumeram coisas do caput ou dos parágrafos dos artigos
abreviação: em números romanos (I, II, III, IV, V, e assim em diante)
exs.: art. 4º, caput, I usque IV, do Código Civil ou
art. 5º, parágrafo único, I e II, do Código Civil
- Alíneas
sub-enumeram coisas dos incisos
abreviação: em letras minúsculas (a, b, c, d, e, f, e assim em diante)
ex.: art. 206, § 1º, II, a, do Código Civil
OBS: grafar as alíneas de preferência em itálico
- Observações finais
a menção pura e simples a um artigo faz referência a ele todo
ex.: art. 206, do Código Civil
sempre que se citar um artigo, mencionar de onde provém
exs.: art. 206, do Código Civil, ou art. 22, da Constituição Federal
23/02/2010 - Prof Bedone - Direito Civil I
FADI - SOROCABA
DIREITO CIVIL I
PARTE GERAL
PRIMEIRO SEMESTRE
09/02 e 10/02/10
A-) PLANEJAMENTO DO SEMESTRE:
- Sujeito a alterações, segundo as circunstâncias o exigirem
- Matérias
Introdução (01)
Instrumentalização (01)
Parte Geral do Código Civil (09)
Aula prática (02)
Atividade extra (02)
Revisão (02)
1ª Prova Parcial (01)
Total (18)
B-) INTRODUÇÃO:
- Hipótese do cachorro
- Fato. Alemanha, início do século XX. Estação ferroviária de Munique.
Dois passageiros: uma mulher com seu cachorro de estimação da raça
dachshund, e um homem cego com seu cão-guia da raça pastor alemão.
Ambos desejam embarcar com seus animais no trem.
- Direito. Há um aviso na estação de trem, com letras garrafais,
dizendo “é terminantemente proibido embarcar com animais nos vagões
destinados aos passageiros”.
- Solução. A cargo do aluno.
- Hipótese da caldeira
- Situação. Determinada indústria possui uma caldeira gerando vapor em
sua planta “1”. As novas instalações (planta “2”) deverão receber o vapor
gerado na planta “1”, sabendo-se que o vapor deverá chegar na planta
“2” superaquecido e a pressão de 10 bar.
- Aplicação. Propor um esquema para a tubulação necessária, utilizando,
para reduzir custos, os seguintes itens disponíveis em estoque: em aço
carbono, tubos de 100 por 98 mm (diâmetros externo e interno) e 50 por
49 mm (idem); ou, em alumínio do tipo 5086, tubos de 80 por 78 mm (diâmetros externo e interno) e 75 por 72 (idem).
- Solução. Explosão.
C-) INFERÊNCIAS:
- Direito é uma ciência tanto quanto qualquer outra
mas aborda e regula comportamentos humanos
ora, sempre estamos inseridos num contexto social
logo, todo mundo pensa que sabe, e às vezes sabe mesmo
- Como aborda e regula comportamentos humanos, é a resultante de um
sistema de valores sociais e de referenciais ideológicos;
tais, por seu turno, vigoram num determinado tempo e lugar;
daí porque o Direito também variar no tempo e no espaço
- São os valores sociais e os referenciais ideológicos que constituem
a base de toda a legislação (ratio legis)
é por esse motivo que, em certas ocasiões, para se cumprir com o
espírito de uma lei, é preciso contrariá-la em sua literalidade
- Além disso, os valores sociais e os referenciais ideológicos são os
responsáveis pelo Direito possuir interface com outras disciplinas
(1º ano, principalmente, e alguma coisa no 2º ano)
- O Direito constitui mera técnica de acomodação de valores sociais e de referenciais ideológicos, i.e., é só uma ferramenta; exs.:
escravidão até quase o final do século XIX, no Brasil
proibição do divórcio até 1.977, no Brasil
supressão da separação, no Brasil (em estudo)
vedação ao casamento inter-racial nos EUA (alguns
estados), até meados do Século XX
autorização para práticas eugênicas nos EUA e Alemanha, até o
final da II Guerra Mundial
anulação de casamento (caso a mulher estivesse deflorada), no Brasil,
formalmente até o início deste Século
- Como é mera técnica de acomodação de valores sociais e de
referenciais ideológicos, é independente de outros tipos de leis,
ou seja, das leis de Deus e das leis da física
- Leis de Deus
o sagrado varia de uma religião para outra, enquanto que as leis dos
homens valem para todas as pessoas de um país
a escolha ou não de uma religião insere-se dentro do contexto da
liberdade de escolha assegurada pelo próprio Direito
a religião diz respeito a condutas praticadas neste mundo, mas
assegura recompensas que não são deste mundo; ex.: Lc, 23, 32-33, e
39-43 (foco na questão dos malfeitores)
já o Direito lida com coisas que começam e findam neste mundo
- Leis da física
descrevem a natureza como ela é, ao passo que o Direito regula o comportamento humano; exs.: lei da gravidade (Newton), leis de
Kepler, lei da relatividade especial (Einstein)
- É dotado de uma característica fundamental, a coercitividade,
já que lastreado na lei, a qual condensa a vontade comum do povo
mas a lei é fruto da atuação estatal, em todos os níveis
logo, o Estado não só é a fonte primordial da produção do Direito,
como também promove o exercício da coerção
portanto, sem poder de coerção não haverá Direito
- Está presente em todos os momentos da vida de uma pessoa,
ainda que não se tenha consciência disso; exs.:
nascimento (aquisição da personalidade civil)
ir à padaria (direito de ir e vir)
dormir à noite (direito ao sossego)
ter uma casa (direito de propriedade)
dirigir um automóvel (normas que regulam o trânsito)
casar-se (direito de família)
falecimento (direito das sucessões)
- É pautado por recortes arbitrários da realidade
nada sabemos em detalhes das vidas das pessoas da hipótese
apenas o necessário para o deslinde do caso
- É algo que evolui, tanto quanto a tecnologia
mas ainda é vislumbrado à moda antiga, sendo que
esse vislumbre é justamente a atividade do jurista
- De fato, esse vislumbre só é alcançado de duas formas
com estudo, do jeito mais tradicional possível (“binômio b/c”)
com percepção da realidade (“lei de black eyed peas”: i gotta fellin’)
- Estudo
base cultural geral + conhecimento específico da ciência jurídica
- Percepção da realidade
sentido que se deve procurar desenvolver
- Depende de atividade intelectual totalmente individual, mas como
estamos inseridos em valores sociais e referenciais ideológicos,
valoramos os fatos, e não só os descrevemos
- A isso se dá a denominação valoração ontológica, cujo resultado é um
juízo de decidibilidade, mas este raramente é unânime, e,
ainda que haja concordância, admite fundamentações diferentes
- A resultante de tudo isso é a média do pensamento jurídico
acerca de determinado assunto
essa média é apurada pela doutrina e pela jurisprudência
- Por via reflexa, nem sempre prevalece a vontade individual do jurista,
dando ensejo ao contexto do contraditório no Direito
ademais, esse contraditório também aparece nos pontos de vista da
parte adversária, já que o Direito é marcado pelo conflito de interesses tudo isso, por seu turno, causa frustração (é bom se acostumar)
- Tem que ser viabilizado em palavras (verbalmente ou por escrito)
então, o que se pensa e o que se sente não é relevante, pelo menos
até que se consiga essa viabilização
- À viabilização em palavras se dá o nome de articulação
nesse ponto, sabemos que uma imagem equivale a mil palavras
o problema se dá quando não há uma imagem disponível
assim, resta-nos somente lançar mão das mil palavras,
mas não só das mil palavras, e sim das melhores mil palavras
- É por isso que Direito é fundamentalmente linguagem
de fato, o direito positivo é expresso em linguagem
os fatos são reproduzidos em linguagem
a solução dos casos é expressa em linguagem
- A solução dos casos é o momento em que o direito positivo e
os fatos se encontram
= subsunção da norma (ou aplicação da lei)
e é o jurista quem promove esse encontro
- Portanto, o processo de escolha das palavras é que conduzirá
à melhor articulação, e, por via de conseqüência,
ao melhor raciocínio jurídico
- Raciocínio jurídico é o fim último a ser atingido ou seja, fazer o aluno não só aprender as matérias, bem como
principalmente a pensar
enfim, o resultado do raciocínio jurídico é a solução de problemas
- Daí a origem da palavra “direito”
vem do latim directum = direto
deve-se ir direto ao ponto visando à resolução de problemas
provavelmente por isso é que se chama direito, e não torto
em italiano tem-se uma idéia mais clara: diritto, sempre dritto
- Em suma, calouro amigo, gravar bem o sentido das expressões:
sistema de valores sociais e referenciais ideológicos
ratio legis
técnica de acomodação de valores sociais e de referenciais ideológicos
independente das leis de Deus e das leis da natureza
poder de coerção
recortes arbitrários da realidade
“binômio b/c” e “lei de black eyed peas”
valoração ontológica
juízo de decidibilidade
contraditório
articulação
linguagem
subsunção da norma
raciocínio jurídico
solução de problemas
D-) DIREITO CIVIL:
- Única disciplina essencialmente técnica do 1º ano
seu estudo servirá de base para as demais,
tanto em função da técnica de abordagem como do conteúdo
- Ramo do Direito que trata da vida cotidiana das pessoas, tanto
físicas como jurídicas, com ênfase naquelas; exs.:
nascituro
nascimento com vida
maioridade
casamento
união estável
adoção
contratos
alimentos
responsabilidade civil
sucessões
testamento
- Outros assuntos
tratamento
freqüência
permanência na sala de aula
equipamentos eletro-eletrônicos
avaliação Código Civil
manual de doutrina
resumo das aulas
acervo jurisprudencial
terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
Aula 2 - Prof. Marum
“A sociedade é produzida por nossas necessidades e o governo por nossa perversidade” (Thomas Paine, Senso comum)
“A sociedade é feita e imaginada (...) portanto, ela pode ser refeita e reimaginada” (Roberto Mangabeira Unger, Política)
1. Origem da sociedade
• O homem: animal político. O ser humano é um ser social. Desde o nascimento, vive normalmente em sociedade: família, escola, clube, igreja, cidade, Estado (“país”), sociedade global. O ser humano isolado é uma exceção. O que leva o homem a viver em sociedade?
• Por que vivemos em sociedade? Determinar o motivo pelo qual o ser humano se reúne em sociedade é importante para se determinar a posição do indivíduo na sociedade: o ser humano foi feito para a sociedade ou a sociedade foi feita para o ser humano? O que é mais importante, a coletividade ou o indivíduo?
• Teorias sobre a origem da sociedade:
a) sociedade natural – o ser humano é dotado de um instinto de sociabilidade que o leva naturalmente a viver em sociedade – o homem é um animal político (ênfase no todo, no coletivo: organicismo): Aristóteles, Cícero, S. Tomás de Aquino, Ranelletti.
“A sociedade que se formou da reunião de várias aldeias constitui a Cidade, que tem a faculdade de se bastar a si mesma, sendo organizada não apenas para conservar a existência, mas também para buscar o bem-estar. Esta sociedade, portanto, também está nos desígnios da natureza (...) É, portanto, evidente que toda Cidade está na natureza e que o homem é naturalmente feito para a sociedade política” (Aristóteles – 384 a.C. - 322 a.C.)
b) sociedade como ato racional – teorias contratualistas: negam o impulso associativo natural; a sociedade é uma criação humana, fruto de uma decisão racional (ênfase no indivíduo - mecanicismo); partindo do estado de natureza, o homem, baseado na razão e por vontade própria, firma um contrato social, estabelecendo um governo e regras para a vida em sociedade.
• Os contratualistas:
a) Thomas Hobbes(1588-1689): a natureza humana não muda, é sempre a mesma (“conhece-te a ti mesmo”); o homem é mau, invejoso, ambicioso, cruel e não sente prazer na companhia do outro; o estado de natureza é uma “guerra de todos contra todos”; o “homem é o lobo do homem”; sem lei nem autoridade, todos têm direito a tudo; a vida é “solitária, pobre e repulsiva, animalesca e breve”; para fugir desse estado, reúnem-se em sociedade e firmam o contrato social, estabelecendo uma autoridade soberana com poder ilimitado e incontestável para impor a ordem (Estado – Leviatã); o pacto é de submissão e não pode ser quebrado; justificação do absolutismo. Obra: O Leviatã.
“Porque as leis de natureza (como a justiça, a eqüidade, a modéstia, a piedade, ou, em resumo, fazer aos outros o que queremos que nos façam) por si mesmas, na ausência do temor de algum poder capaz de levá-las a ser respeitadas, são contrárias a nossas paixões naturais, as quais nos fazem tender para a parcialidade, o orgulho, a vingança e coisas semelhantes. E os pactos sem a espada não passam de palavras (...) À multidão assim unida numa só pessoa se chama Estado, em latim civitas. É esta a geração daquele grande Leviatã, ou melhor (para falar em termos mais reverentes), daquele Deus Mortal, ao qual devemos, abaixo do Deus Imortal, nossa paz e defesa. Pois graças a esta autoridade que lhe é dada por cada indivíduo no Estado, é-lhe conferido o uso de tamanho poder e força que o terror assim inspirado o torna capaz de conformar as vontades de todos eles, no sentido da paz em seu próprio país, e da ajuda mútua contra os inimigos estrangeiros” (Hobbes)
b) John Locke(1632-1704): inspirador da “Revolução Gloriosa”, que estabeleceu a monarquia moderada na Inglaterra (1688-89); estado de natureza pacífico, com os homens gozando dos direitos naturais à vida, à liberdade e aos bens; contrato social para a proteção desses direitos; o consentimento é a base da autoridade; Estado com poder limitado e baixo grau de intervenção na vida social (individualismo liberal); direito de rebelião caso o governo não cumpra o dever de proteger os direitos naturais. Influência na independência dos EUA. Obra: Segundo tratado sobre o governo.
“O poder político é o que cada homem possuía no estado de natureza e cedeu às mãos da sociedade e dessa maneira aos governantes, que a sociedade instalou sobre si mesma, com o encargo expresso ou tácito de que seja empregado para o bem e para a preservação de sua propriedade (...) Esse poder tem origem somente no pacto, acordo e assentimento mútuo dos que compõem a comunidade (...) Digo que empregar a força sobre o povo, sem autoridade e contrariamente ao encargo contratado, a quem assim procede, constitui estado de guerra com o povo, que tem o direito de restabelecer o poder legislativo ao exercício de seus poderes” (Locke)
c) Barão de Montesquieu (1689-1755): estado de natureza pacífico; seres humanos se aproximam pelo medo e pela atração mútua; estado de guerra começa depois do surgimento da sociedade; necessidade do estabelecimento, por acordo, das leis e do Estado, que devem ser organizados de forma apropriada para cada sociedade, pois as leis são as “relações necessárias que derivam da natureza das coisas”. Influência no constitucionalismo. Obra: O espírito das leis.
“O homem, no estado natural (...) pensaria na conservação do seu ser (...) Semelhante não sentiria a princípio senão a sua fraqueza; sua timidez seria extrema (...) Nesse estado, cada qual sente-se inferior; mal percebe a igualdade. Nem procurariam pois atacar-se, e a paz seria a primeira lei natural (...) Mas as demonstrações de um temor recíproco fá-los-iam logo aproximar-se. Seriam levados talvez pelo prazer que sente um animal à aproximação de outro da sua espécie (...) Os homens, tão logo se acham em sociedade, perdem o sentimento de fraqueza; a igualdade, que existia entre eles, cessa; e o estado de guerra começa (...) Esses dois tipos de estado de guerra [de nação contra nação e indivíduo contra indivíduo] fazem estabelecer as leis entre os homens (...) O governo mais conforme à natureza, deve admitir-se, é aquele cuja disposição particular melhor corresponde à disposição do povo para o qual é estabelecido” (Montesquieu)
d) Jean Jacques Rousseau (1712-1778): precursor do Romantismo; seres humanos livres, iguais e bons no estado de natureza; perda da liberdade após o estabelecimento de uma sociedade baseada na propriedade; necessidade de um contrato social legítimo, que garanta a liberdade e a igualdade de todos, com a prevalência da soberania do povo (vontade geral). Influência na Revolução Francesa. Obras: Discurso sobre a desigualdade e O contrato social.
“O primeiro que, tendo cercado um terreno, lembrou-se de dizer: ‘Isto é meu’, e encontrou pessoas bastante simples para crê-lo, foi o verdadeiro fundador da sociedade civil. Quantos crimes, guerras, mortes, quantas misérias e horrores não teria poupado ao gênero humano aquele que, arrancando as estacas ou enchendo o fosso, tivesse gritado aos seus semelhantes: ‘guardai-vos de escutar este impostor; estais perdidos se esquecerdes que os frutos são para todos, e que a terra é de ninguém!’” (...) “Encontrar uma forma de associação que defenda e proteja, com a toda a força comum, a pessoa e os bens de cada associado, e pela qual cada um, unindo-se a todos, só obedece contudo a si mesmo, permanecendo assim tão livre quanto antes. É esse o problema fundamental ao qual o Contrato Social dá a solução” (Rousseau)
• Conclusão: atualmente predomina a opinião de que o ser humano é naturalmente levado a viver em sociedade, sem que isso exclua a participação da sua vontade racional, conciliando, assim, as duas teorias. A teoria do contrato social, como um acordo entre pessoas livres e iguais que estabelece regras de convivência social e para o exercício do poder, é utilizada como uma justificação racional para a existência da sociedade e do Estado.
Leitura essencial: Dalmo Dallari, Elementos de Teoria Geral do Estado, Cap. I, itens 5 a 10.
Leitura complementar: Francisco Weffort, Os clássicos da política, vol. 1, capítulos 3, 4, 5 e 6.
Filme: A Guerra do Fogo (La Guerre du feu, França/Canadá, 1981,
Dir.: Jean-Jacques Annaud)
Aula 1 - Ciência Política e Teoria Geral do Estado
“O de que mais se precisa no preparo dos juristas de hoje é fazê-los conhecer bem as instituições e os problemas da sociedade contemporânea, levando-os a compreender o papel que representam na atuação daquelas (instituições) e aprender as técnicas requeridas para a solução destes (problemas)” (Bodenheimer)
• Apresentação do curso. Orientações gerais.
• Obra básica do curso: Elementos de Teoria Geral do Estado, de DALMO DE ABREU DALLARI (ed. Saraiva).
• Leitura obrigatória para o semestre: O que é participação política, de DALMO DE ABREU DALLARI (Coleção Primeiros Passos, ed. Brasiliense).
• Programa da disciplina, bibliografia, resumos e textos complementares em: http://professormarum.blogspot.com/
• Por que estudar Política e Estado num curso de Direito?
• Para Goffredo Telles Jr., o Direito como disciplina da convivência humana e garantia da liberdade. Para que as pessoas possam conviver em sociedade, são necessárias algumas regras, pois onde há fracos e fortes, a liberdade oprime, a lei é que liberta (Lacordaire)
• O que é política? Política é tudo que diz respeito à polis (cidade ou Estado em grego): leis, governo, obras e serviços públicos, polícia etc.
• Definição: “Política é o complexo de atividades que se realizam na prática para alcançar, exercer ou manter o poder estatal” (REINALDO DIAS).
• A disciplina da convivência humana (Direito) é elaborada e imposta pelo Estado, por meio da Política.
• A Ciência Política é o conhecimento e o estudo sistematizado da Política
• A importância da participação política.
“Quem não se interessa pela política condena-se a ser governado pelos que se interessam” (Toynbee)
"O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra e corrupto. O analfabeto político é lacaio dos exploradores do povo." (Bertold Brecht)
“Primeiro, eles vieram pegar os comunistas, mas eu não era comunista e não falei nada. Depois vieram pegar os socialistas e os sindicalistas, mas eu não era nenhum dos dois e não falei nada. Logo vieram pegar os judeus, mas eu não sou judeu e não falei nada. E, quando vieram me pegar, não sobrava mais ninguém que pudesse falar por mim” (Texto atribuído a Bertold Brecht, mas que na verdade é de Martin Niemoller, pastor protestante que sobreviveu aos campos de concentração nazistas).
“Diferentemente de qualquer outra comunidade, nós, atenienses, consideramos aquele que não participa de seus deveres cívicos não como desprovido de ambição, mas sim como inútil” (Péricles, 430 a. C.)
“Existe uma atividade política autêntica, necessária, voltada para o bem comum. Essa atividade tem alto valor moral, porque se inspira na solidariedade humana e na consciência de que todos os seres humanos são responsáveis pela defesa e promoção da dignidade humana” (Dalmo Dallari).
Bibliografia
Leitura essencial: Dalmo Dallari, Elementos de Teoria Geral do Estado, Introdução, itens 1 a 4.
Leituras complementares: Reinaldo Dias, Ciência Política, cap. 1. Norberto Bobbio, Dicionário de política, verbete “Política”. Goffredo Telles Junior, Saudação aos calouros de 2007 (http://www.conjur.com.br/2009-jun-28/leia-discurso-goffredo-telles-jr-homenageou-goffredo-telles-jr).